Texto de autoria de Fábio Nogueira - estudante de história da Universidade Castelo Branco e militante da Educafro. E-mail: castelohistoriaucb.66@gmail.com
Década de setenta: eu era um molequinho que não tinha maldade na época. Sala da casa onde morávamos, na Vila Aliança, em Bangu, tinha a famosa TV preta e branca. Eram raríssimos os moradores daquela época que possuíam uma TV em cores e telefone fixo. Contávamos a dedos quem eram os afortunados.
Não me lembro qual era o canal de TV que exibia o famoso programa de Black Music, o Soul Train (lembro-me quem estava à frente do programa era o famoso DJ’S Mounsieur), e ficava assistindo aqueles homens e mulheres de cabelos grandes, roupas coloridas sapatos plataforma e danças pra lá de zoeira. Perto da minha casa, tinha a associação de moradores da Vila Aliança, a (AREVA), onde meu pai era diretor. Ali era dos poucos ambientes de lazer que tínhamos na ocasião. No centro de Bangu, o Cassino Bangu e o Bangu Atlético revalidavam uma disputa saudável entre 'cocotinhas' e as minas black’s. Enquanto os rapazes...... só queriam sair na porrada .
Os bailes Black’s, como eram chamados, era o local de encontro da galera e meu pai levava-me para ficar perto dele. Ouvia de tudo um pouco dessa época: James Brown, kc & the sunshine band, Gerson King Combo, Lady Zú e Barbara Mason, Barry White e outros .
Esses bailes de bairros da periferia do Rio de Janeiro deixavam os militares de antena ligada. Além de estarmos vivendo numa ditadura onde e o AI-5 estava em pleno vapor, havia o receio que esses baile de origem norte-americana trouxessem também o medo da onda negra dos direitos civis. A nação americana estava mergulhada em outro conflito além dos direitos civis, a guerra do Vietnã.
O governo militar estava coletando informações desses bailes através de agentes do SNI (SERVIÇO NACIONAL DE INFORMAÇOES). É bom destacarmos que estávamos sob a lei do AI-5, quer dizer, os direitos civis estavam restritos . Qualquer ameaça à ordem daquele momento era considerada um agente nocivo ao regime militar.
Entre os intervalos e outros momentos, o discurso antirracismo e contra a ditadura militar eram constantes. Pagava-se o preço alto por este desafio, o AI-5 corria solto. O lado bom desse desafio era o prenúncio dos primeiros movimentos contra o racismo, nos anos finais da década de 70.
https://www.historiadaditadura.com.br/destaque/dancando-sob-a-mira-do-dops-bailes-soul-racismo-e-ditadura-nos-suburbios-cariocas-nos-anos-1970/
Esses bailes eram a maior concentração de pretos num espaço social. Depois dos ensaios das escolas de samba, onde os pretos e pretas reinavam absolutos, os bailes Black’s eram a outra opção para quem curtia sons vibrantes.
Foram muitas as facetas desse bailes Black’s do Rio de Janeiro. Na verdade não tinha a noção ideológica desses bailes da periferia carioca. Era criança e queria brincar. Não passava na minha cabeça o que era então o regime militar.
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